quarta-feira, 23 de março de 2011

Fernando Pessoa *



"São as pessoas que habitualmente me cercam, são as almas que, desconhecendo-me, todos os dias me conhecem com o convívio e a fala, que me põem na garganta do espírito o nó salivar do desgosto físico. É a sordidez monótona da sua vida, paralela à exterioridade da minha, é a sua consciência íntima de serem meus semelhantes, que me veste o traje de forçado, me dá a cela de penitenciário, me faz apócrifo e mendigo."

terça-feira, 22 de março de 2011

Contrariamente certo

Eu
Vejo a voz
Seguro os olhos
Escuto a mão
Respiro o abraço
Que o mundo me zela.


Dentro de mim
Sinto o mundo
Ao contrário
Para os meus olhos
O verem
Às direitas. 

É um viver contrariamente certo...

sexta-feira, 18 de março de 2011

O amor que fica…

Os raios de sol segredam-lhe que mais uma noite cessara e que a saudade, essa, se camuflou. O sentimento de separação das coisas ou pessoas que gosta, que estão distantes ou não mais possui, mascarou-se para mais um amanhecer.
Todos os dias, a todos os instantes ela tem perdas, separações e distâncias. O seu presente, logo se transforma em passado que de alguma forma lhe traz saudade de alguém, de um momento de uma passagem.
A vida arrasta-se numa constante saudade. Mas, no aconchego da sua solidão, entende que a saudade é um sentimento de amor que fica, é lembrança das coisas boas que viveu, das pessoas queridas que teve, dos amores compartilhados.
A cada noite que cai ela aprende a viver a saudade, salvando a essência das coisas que passaram, lembrando os momentos felizes vividos, afastando a dor, pois não há dor que resista às alegrias vividas.

Só assim ela consegue dar permanência e imortalidade ao sentimento. Só assim ela desperta a saudade como um sentimento de amor que ficou e ficará para sempre na memória de um passado.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Atitudes

Injustas
Trazem culpa
Que o arrependimento
Não atenua.

Na consciência
Os actos intempestivos
Quando reflectidos
São algozes
Do nosso íntimo.
Quando somos injusto a culpa apresenta a conta à nossa consciência.



Apontei um dedo quando tinha todos os outros voltados para mim. Precipitei-me e interpretei mal o que era de espontânea compreensão. É fácil dizer o que não gostamos que nos façam, difícil, por vezes, é não fazer o que não gostamos que nos façam a nós.



quarta-feira, 16 de março de 2011

"Na ilha por vezes habitada do que somos,

há noites, manhãs e madrugadas em que não precisamos de morrer. Então sabemos tudo do que foi e será. O mundo aparece explicado definitivamente e entra em nós uma grande serenidade, e dizem-se as palavras que a significam. levantamos um punhado de terra e apertamo-la nas mãos. Com doçura. Aí se contém toda a verdade suportável: o contorno, a vontade e os limites. podemos então dizer que somos livres, com a paz e o sorriso de quem se reconhece e viajou à roda do mundo infatigável, porque mordeu a alma até aos ossos dela. Libertemos devagar a terra onde acontecem milagres como a água, a pedra e a raiz. Cada um de nós é por enquanto a vida.



Isso nos baste."

José Saramago

segunda-feira, 14 de março de 2011

Sempre amei por palavras muito mais do que devia

são um perigo
as palavras

quando as soltamos já não há
regresso possível
ninguém pode não dizer o que já disse
apenas esquecer e o esquecimento acredita
é a mais lenta das feridas mortais
espalha-se insidiosamente pelo nosso corpo
e vai cortando a pele como se um barco
nos atravessasse de madrugada

e de repente acordamos um dia
desprevenidos e completamente
indefesos


um perigo
as palavras


mesmo agora
aparentemente tão tranquilas
neste claro momento em que as deixo em desalinho
sacudindo o pó dos velhos dias
sobre a cama em que te espero.

Alice Vieira

"O que dói às aves"


quinta-feira, 10 de março de 2011

ENTRE A VERTIGEM E O SILÊNCIO

Sim esta é a minha rua
a minha sala, o meu quarto, o meu colchão
em vez de janelas há estrelas
e o tapete o passeio, as pedras do chão
o candeeiro a luz da lua
o cobertor caixas forradas de papel
em vez de vontade o cansaço
em vez de um beijo o vento a rasgar-me na pele
Talvez um dia possa ser
tudo o que o meu sonho quiser
e assim chegue ao pé de ti
talvez um dia possa ser
talvez um dia possa querer
acordar-me a mim
Sim esta é a minha vida
dois braços baixos aí estendidos no chão
entre o silêncio e a vertigem
sorriso gasto sem calor no coração
o sol não nasce, apenas passa
o tempo cai sem nada desenhar no céu
arrasto pegadas na alma
olho pra trás e vejo não há nada meu...


Nuno Norte

quarta-feira, 9 de março de 2011

Pedras...

Nem tudo são tristezas
Ou amarguras,
Nem tudo é dor
Ou sofrimento.

Como todas as pessoas tenho os meus momentos menos bons,
Mas apenas de mim depende a força para os ultrapassar.
Hoje é bem mais fácil do que ontem
E amanhã já aprendi a lidar com as dificuldades da vida, que me ensinam a valorizar o que de bom tenho agora.



A cada pedra no nosso caminho podemos:
Passar por cima dela e sentir o seu peso em cima de nós,
Passar ao lado e a cada dia tropeçar nela, ou
Podemos carrega-la aos ombros e coleccionar experiências que nos fazem crescer e dar valor ao que somos, VIDA!

segunda-feira, 7 de março de 2011

Hoje abro as mãos

Hoje
Não tenho coração
Somente hoje
Guardo-o num recanto do mundo
Para que alguém o encontre
O guarde e
Tome conta dele
Porque
Eu tenho falhado
Porque eu…
Eu sou incapaz de lhe dar um abrigo seguro.
Em toda a minha vida fui incapaz de o guardar no peito
Sempre o tive entre mãos
Para o entregar em mãos que o deixaram cair
Por isso,
Hoje abro as mãos
E liberto o que já não me pertence mais…



As palavras molhadas nas lágrimas contidas nos olhos,
Esbatem o sorriso esmagado pela voz que se prende no rosto contido.
Tenho as emoções à flor da pele
porque, hoje, o meu coração não me sente mais...



sábado, 5 de março de 2011

Ainda que

Viro-as do avesso
agito-as
sacudo-as
ando com as palavras às voltas
para as fazer exprimir o que me vai no âmago



Ainda que procure as palavras e
Ainda que as encontre 
vou sempre perde-las 
porque não sou palavras
sou sentimentos...




quarta-feira, 2 de março de 2011

Deixa-me...

Eu sei, não digas, deixa-me inventar-te.
...


Tenho  construído o teu nome com todas as coisas,
tenho feito amor de muitas maneiras,
docemente,
lentamente,
desesperadamente,
à tua procura, sempre à tua procura
até me dar conta que estás em mim,
que em mim devo procurar-te.

Joaquim Pessoa