quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Pessoa

"Penso às vezes, com um deleite triste, que se um dia, num futuro a que eu já não pertença, estas frases, que escrevo, durarem com louvor, eu terei enfim a gente que me «compreenda», os meus, a família verdadeira para nela nascer e ser amado. Mas, longe de eu nela ir nascer, eu terei já morrido há muito. Serei compreendido só em éfígie, quando a afeição já não compense a quem morreu a só desafeição que houve, quando vivo.

Um dia talvez compreendam que cumpri, como nenhum outro, o meu dever-nato de intérprete de uma parte do nosso século; e, quando o compreendam, hão-de escrever que na minha época fui incompreendido, que infelizmente vivi entre desafeições e friezas, e que é pena que tal me acontecesse. E o que escrever isto será, na época em que o escrever, incompreendedor, como os que me cercam, do meu análogo daquele tempo futuro. Porque os homens só aprendem para uso dos seus bisavós, que já morreram. Só aos mortos sabemos ensinar as verdadeiras regras de viver.

Na tarde em que escrevo, o dia de chuva parou. Uma alegria do ar é fresca de mais contra a pele. O dia vai acabando não em cinzento, mas em azul-pálido. Um azul vago reflecte-se, mesmo, nas pedras das ruas. Dói viver, mas é de longe. Sentir não importa. Acende-se uma ou outra montra.

Em uma outra janela alta há gente que vê acabarem o trabalho. O mendigo que roça por mim pasmaria, se me conhecesse.

No azul menos pálido e menos azul, que se espelha nos prédios, entardece um pouco mais a hora indefinida.

Cai leve, fim do dia certo, em que os que crêem e erram se engrenam no trabalho do costume, e têm, na sua própria dor, a felicidade da inconsciência. Cai leve, onda de luz que cessa, melancolia da tarde inútil, bruma sem névoa que entra no meu coração. Cai leve, suave, indefinida palidez lúcida e azul da tarde aquática - leve, suave, triste sobre a terra simples e fria. Cai leve, cinza invisível, monotonia magoada, tédio sem torpor."









Fernando Pessoa In Desassossego

Noutros tempos.

No céu vi nuvens, nuvens que partiram e deixo para trás,
O céu é, neste momento, azul dia e noite.
Já foram longos os quilómetros para alcançar o Olimpo,
Engraçado agora encolheram.
Muitas pessoas viajam comigo, tantas outras escrevem, o álbum das saudades e
O que não foi registado no papel fica gravado na alma.
Por onde andei fui tão longe que alcancei o horizonte,
E agora caminho em abraços abertos que me esperam ao fundo da rua…
Noutros tempos
A viagem da vida pareceu mais longa nos minutos apressados de cabeça para baixo…





Dizem que o céu é infinito… hoje vi, não tem fim…

Rimas improvisadas...



Às montanhas que rasgam o céu junto o oceano que abre o horizonte, lavo as saudades em lágrimas e oculto a tristeza num manto de neblina. Acolho o fado das minhas entranhas gritado e desfaço o coração em poemas, rimas improvisadas…

sábado, 25 de setembro de 2010

Sentimento egoísta ou pessoas egoístas?

O amor é…

Amar é…


Confesso, gosto de ler como diferentes pessoas definem o amor, o que é amar alguém…gosto de ver como todas elas acabam por dizer o mesmo usando diferentes palavras. É interessante contemplar que este sentimento é descrito ou definido ao longo dos tempos com a mesma essência, mas por outras palavras ou mesmo por palavras permutadas. Visto desta forma até parece que o amor é uma frase criada ou, até mesmo, um sentimento único, imutável no tempo. “O amor é: dois corações tornarem-se um” é a frase em que a humanidade resume ser o amor.

Confesso gostar de ler, gostar de ver e achar interessante como é definido o amor porque não sei definir o amor... quando amo os corações não se tornam um…

Mas o que significa dois corações tornarem-se um? O que representa um mais um ser igual a um? Querem com isto dizer que quando se ama alguém, o sentimento que ambos sentem é igual? Que os dois se amam exactamente da mesma forma? Não será isto uma ilusão? Não será isto egoísmo? Cada ser humano é único, cada coração é singular e exclusivo na sua natureza de amar, de sentir. Ninguém ama igual a ninguém, ninguém ama igual cada amor que vive, nem mesmo, ninguém ama igual o próprio amor que vive no momento. No decorrer dos dias nós mudamos, a pessoa que está connosco muda.

O coração não bate todos os dias da mesma forma, como podemos esperar ser amados fielmente como amamos, quando nós próprios amamos todos os dias de forma diferente...

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Hmm... e que dizes em...

tentar saber,
tentar descobrir,
tentar ver,
tentar sentir
o que sou...

hmm... que me dizes em...
mostrar um pouco de ti, colheres um pouco de mim...

podes continuar ver-me da mesma forma de sempre, mas podes, também, passar a ver-me de verdade...

domingo, 12 de setembro de 2010

A UM LIVRO



No silêncio das cinzas do meu Ser
Agita-se uma sombra de cipreste,
Sombra roubada ao livro que ando a ler,
A esse livro de mágoa que me deste!

Estranho livro aquele que escreveste, 
Artista da saudade e do sofrer!
Estranho livro aquele em que puseste
Tudo o que eu sinto, sem poder dizer!

Leio-o e folheio, assim toda a minh'alma!
O livro que me deste é meu e salma
As orações que choro e rio e canto!...

Poeta igual a mim, aí quem me dera
Dizer o que tu dizes!...Quem soubera
Velar a minha Dor desse teu manto!...



Florbela Espanca 
in
Poesia Completa 

terça-feira, 7 de setembro de 2010

A espontaneidade...

Este mundo de existências vãs é um teatro. As pessoas frequentemente representam monólogos do que não são, do querem ser e não são, do que tentam mostrar ser e não conseguem. Elas agem de forma premeditada esperando obter comportamentos previsíveis. Os seus gestos, as suas palavras, os seus pensamentos estão enclausurados em personagens fictícias que procuram ser os que os outros esperam que elas sejam.



Esquecem-se que, no mundo do espectáculo, os aplausos não duram para sempre. Quando o pano desce a plateia vira de costas e saí apressada.



A liberdade é uma utopia.
A espontaneidade morreu.